O Brasil intensificou seus esforços para construir relações mais estreitas com a África, num esforço da sexta maior economia do mundo em competir com outros gigantes como China e Índia para assumir um papel central no continente rico em recursos naturais.
No mês passado, o maior banco de investimento no Brasil, BTG Pactual, anunciou planos para levantar US$ 1 bilhão e criar o maior fundo de investimento do mundo para a África, focando em áreas como infraestrutura energia e agricultura.
O fundo do banco independente, que surge em meio a uma iniciativa do governo para estabelecer uma parceria estratégica com a África, é uma das mais recentes medidas sinalizando o crescente interesse do Brasil para ampliar sua pegada econômica no continente - o comércio entre o Brasil e a África saltou de cerca de US$ 4 bilhões em 2000 para aproximadamente US$ 20 bilhões em 2010. "Isso representa um ponto de virada em que uma porção desses investidores e dessas instituições de investimento está reconhecendo que a África é, de fato, a última fronteira do crescimento", diz Lyal White, diretor do Centro para Mercados Dinâmicos do Gordon Institute for Business Science da África do Sul.
De olho no potencial. Uma década de crescimento econômico sem precedente na África, combinada com uma série de reformas políticas e institucionais, atraiu potências emergentes globais para o continente em busca de uma forte base na região em sua aposta para atingir mais mercados e forjar novas alianças políticas.
"O Brasil vem operando meio fora do radar; ele não é visto necessariamente como um player como os outros (China e Índia)", diz Markus Weimer, pesquisador no Africa Program da Chatham House. "As histórias do Brasil com a África também têm sido menos contenciosas - já se ouviram histórias da Zâmbia sobre mineiros sendo maltratados por seus patrões chineses, mas não se ouve isso de Moçambique ou Angola com respeito de companhias brasileiras."
Usando países de fala portuguesa como Angola e Moçambique como ponto de entrada no continente, empresas estatais e privadas brasileiras fizeram grandes incursões em várias partes do continente, operando, sobretudo, em setores estratégicos como infraestrutura, mineração e energia - no ano passado, a Vale anunciou planos para gastar mais de 12 bilhões de libras em investimentos na África nos próximos cinco anos.
Mas embora o Brasil pareça, como a China, profundamente engajado no setor de recursos naturais africano, para alguns analistas seus interesses e estratégia são bastante distintos dos de seu parceiro do Bric. "Na condição de país rico em recursos naturais e um futuro grande exportador de petróleo, o Brasil não está seguindo uma estratégia de assegurar recursos", diz Christina Stolte, pesquisadora do Instituto Alemão de Estudos de Área e Globais. "A economia sul-americana está vendo a África mais como um meio para diversificar seus mercados de exportação."
Laços fortes. Embora separados pelo Oceano Atlântico, Brasil e África têm antigos laços históricos e culturais que remontam aos tempos do tráfico de escravos no século 16, quando legiões de africanos foram enviados de navio à antiga colônia portuguesa para servir de escravos nas plantações de cana de açúcar.
Hoje, o Brasil trata de usar sua afinidade cultural com a África como uma vantagem na competição com as outras potências que estão agindo no continente, segundo analistas. "O fato de a maioria da população brasileira ser de origem afro-brasileira - o que confere ao Brasil a maior população negra do mundo depois da Nigéria - é amiúde citado pela elite governante, quase exclusivamente branca, do país, para ressaltar as semelhanças culturais do Brasil com os países africanos", disse Stolte.
O Ocidente estará perdendo para a China na África? Essas observações puderam ser ouvidas com frequência durante a presidência de 2003-10 de Luiz Inácio Lula da Silva, que fez da Africa uma prioridade estratégica para o Brasil como parte dos esforços do país para expandir sua influência global. Durante seus oito anos na presidência, Lula fez 12 viagens à África, visitando 21 países, mais do que qualquer um de seus antecessores. Ao mesmo tempo, o Brasil aumentou o número de suas embaixadas na África de 17 em 2002 para 37.
O envolvimento crescente do Brasil com a África também teve continuidade sob a liderança de Dilma Rousseff, que se tornou presidente do Brasil em janeiro de 2011 - em seu primeiro ano no cargo, Dilma visitou Angola, Moçambique e África do Sul.
Analistas dizem que o Brasil adotou uma abordagem tríplice para seu envolvimento com a África, com uma "interação quase direta" entre governo, setor privado e instituições de desenvolvimento.
Empresas brasileiras que tentam fazer negócios no continente tendem a contratar e treinar força de trabalho local e oferecer produtos sociais para promover o desenvolvimento nativo - em Angola, a construtora brasileira Odebrecht tornou-se a maior empregadora privada do país.
Nas últimas décadas, o Brasil passou de importador líquido de alimentos a um dos maiores exportadores mundiais de produtos agrícolas e alimentares. Mais recentemente, a renda per capita no Brasil cresceu em média 1,8% mais rápido que seu PIB em 2003-09, segundo um relatório do Banco Mundial.
Com isso, a experiência de desenvolvimento doméstico e o sucesso na redução da desigualdade social do Brasil atraíram a atenção de vários países africanos que estão ansiosos para reproduzir alguns de seus programas.
Analistas dizem que o Brasil está interessado em explorar seu know-how tecnológico avançado para ajudar países africanos em áreas que são chaves para o desenvolvimento do continente, entre as quais agricultura tropical e combate a doenças.
"O Brasil se vê, portanto, como um parceiro de países africanos, um país capacitado a lhes oferecer estratégias bem-sucedidas para combater os problemas mais cruciais do continente, como a fome e a aids", diz Stolte.
Fonte: O Estado de São Paulo
Comments