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GASTO COM IMPORTAÇÃO DE INSUMOS SUPERA EXPORTAÇÃO INDUSTRIAL

No ano passado, pela primeira vez, as receitas recebidas pelas exportações da indústria de transformação foram insuficientes para pagar os gastos do setor com a importação de insumos, peças e componentes, segundo estudo divulgado pela Confederação Nacional da Indústria de Transformação (CNI) e Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex). Essa relação negativa indica que o aumento das importações de matérias-primas não serviu para incrementar as exportações e foi usado para abastecer o mercado interno.

A relação entre as exportações e os insumos - chamada de exportação líquida - foi apenas levemente negativa na indústria de transformação, de menos 0,1%, mas ela vem em trajetória negativa desde 2004 e 2005, e confirma que o país perdeu espaço nas cadeias globais de produção. Do total de 21 segmentos do setor de transformação analisados, 11 exportaram um valor inferior ao gasto com insumos comprados no exterior no ano passado. Na indústria geral, com a ajuda do setor extrativo, essa relação vira positiva.

Entre insumos e produtos finais importados pelo Brasil, a participação da importação no consumo doméstico de bens industriais alcançou 22,3%, crescendo, apesar da desvalorização do real, em relação ao recorde anterior de 20,7%, registrado em 2012. Isso significa que um em cada cinco produtos consumidos no país tem sido produzido fora do Brasil. Ao mesmo tempo, o novo patamar do câmbio ainda foi insuficiente para, sozinho, dar impulso às exportações, cujo peso no faturamento da indústria ficou praticamente estável para a indústria geral, em 19,8%, e cresceu levemente, de 15,7% para 16,1% no setor de transformação.

"O problema não é o tamanho das importações, mas o fato de que elas não estão gerando mais recursos, via exportações", pondera o professor Jorge Arbache, da Universidade de Brasília (UnB). "Estamos importando apenas para abastecer o consumo interno", acrescenta, ponderando que os dados refletem a ausência do Brasil nas cadeias globais de produção. Nessa situação, diz ele, em que as importações não geram valor, elas representam uma fraqueza. Na média, 24% dos insumos industriais já são importados.

No ano passado, no total do comércio exterior de bens industriais (insumos e produtos acabados), o déficit brasileiro bateu novo recorde, chegando a US$ 54 bilhões. Por segmento, o resultado é fortemente concentrado em produtos de alta e média alta tecnologia, onde o déficit chega a US$ 93 bilhões, resultado parcialmente compensado pelos resultados em áreas de menor complexidade tecnológica. "Inserção em cadeias globais não é feita com baixo custo, é preciso inovação, tecnologia, capacidade de fazer a própria inserção", diz Arbache, afirmando que nem custo baixo o Brasil tem nesse momento.

O movimento da indústria é distinto do que sugere uma política efetiva de inserção positiva de um país no comércio global, de acordo com Julio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica da Fazenda. O quadro atual é de grandes empresas comprando produtos no exterior para abastecer o mercado interno. "As cadeias globais são sobretudo dominadas por multinacionais, que dividem a produção em nível mundial. Todas elas estão instaladas no Brasil, mas o país é utilizado como mercado e não como parte do processo de produção", diz. Para Arbache, parte da perda do dinamismo exportador está ligada a fatores estruturais, onde a mola propulsora da economia sempre foi o mercado interno. Com poucas exceções, diz ele, as multinacionais não se instalaram no Brasil para fazer uma plataforma de exportação. Mesmo o ciclo mais recente do setor automotivo, lembra, veio para abastecer o consumo doméstico.

Luis Afonso Lima, diretor-presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luís Afonso Lima, lembra que em ranking organizado no ano passado pela Unctad, o Brasil ficou em uma das últimas posições em termos de participação nas cadeias globais de produção. O país continua atraindo fortes fluxos de investimento direto estrangeiro, mas ele teve, nos anos mais recentes, foco no setor de serviços, e, no caso da indústria, buscou o abastecimento do mercado doméstico, diz Lima.

Os resultados do ano passado são fruto "de um filme e não de um retrato", na visão de Rodrigo Branco, pesquisador do Centro de Estudos de Estratégias de Desenvolvimento da Uerj (Cedes /Uerj). A indústria nacional, segundo ele, vem registrando consecutivamente aumento de importações acima das exportações. "A indústria de transformação, principalmente, vem perdendo nas duas pontas. Era esperado que uma hora a relação se invertesse. Quando o resultado da balança comercial foi ficando mais sustentado por commodities do que manufaturas, esse cenário começou a ser desenhado", afirma.

Para Arbache, o trabalho da CNI/Funcex mostra que o câmbio sozinho não foi suficiente para alterar a tendência dos últimos anos de perda de competitividade da indústria brasileira. "Câmbio é preço, por isso ele é importante e sempre será, mas existe um problema de competitividade sistêmica a ser enfrentado", afirma Arbache, lembrando que não adianta resolver um só problema, como a infraestrutura, porque há um conjunto de questões a serem enfrentadas, como produtividade do trabalhadores, ambiente regulatório, custos, entre outros. "E quanto mais longa a cadeia, maior o problema, e mais a falta de competitividade afeta a produção", diz o professor da UnB.

Reverter a relação entre exportações e insumos importados não será uma tarefa fácil e não apenas do câmbio, dizem os economistas. Arbache lembra que anos de real valorizado desfizeram cadeias internas de produção. O movimento do produtor de um bem final que foi buscar insumos importados, muitas vezes, levou ao fechamento (ou mudança de foco de negócio) do antigo fornecedor local.

A política industrial brasileira também precisa ser "menos defensiva" e aliviar um pouco o foco no mercado interno, considerado excessivo por Gomes de Almeida. Segundo ele, o segredo de quem teve uma inserção bem-sucedida na globalização foi a adoção de ampliação da importação que aumentasse a capacidade exportadora. "Não acho errada a política industrial do governo. Mas o país está fazendo a primeira parte sem conseguir a segunda. Esse é o grande problema que a política industrial precisa resolver", afirma.

Fonte: UniMercoSul

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